O estranho caso das leituras enjoatórias

domingo, 15 de fevereiro de 2009

 

Muitas vezes, criticam-me por defender ideias que não passam de mera utopia (Argumento que eu considero bastante questionável. Mais tarde falarei do assunto). Porém, aqui, o assunto tem tudo de prático e muito pouco de teórico.

Os Maias, de momento, estão parados a meio do capítulo XI, o que significa que tenho que ler mais sete capítulos e meio (umas poucas 350 páginas) até acabar aquilo. A ficha de leitura é no princípio de Março, o que significa que tenho cerca de meio mês para ler o livro.

Fosse este outro livro qualquer, um que eu tivesse, de facto, escolhido ler, esse tempo chegaria e sobraria para o efeito. Porém, não é esse o caso aqui. Eu nunca quis ler Os Maias. Ora, como eu já disse, é impossível estar motivado quando se faz algo à força – o que, aqui, significa que não só leio mais devagar, como leio menos de cada vez. O tamanho do livro (mais de 700 páginas) desencoraja ainda mais a leitura.

Pior, como eu prefiro ler livros em série, isto é, um de cada vez, até ler Os Maias não tenho oportunidade de ler mais nada. E isto é que me massacra a alma. Eu tenho uns quantos livros que já comprei há algum tempo, alguns talvez até no ano passado (um deles foi-me oferecido por escolha minha no Natal: A Viagem do Elefante de Saramago). Ainda não os li! Por que será? Por causa daquele livro maldito. Ora, isto já ilustra a completa estupidez que são as leituras obrigatórias. Senão vejamos:

  • Como todas as pessoas são diferentes, é altamente benéfico para elas seguirem os caminhos da sua preferência (ideia que não tem necessariamente de estar restrita às leituras);
  • Em pessoas da minha idade (incluindo eu mesmo) a imposição tende a causar aversão, o que vai contra até mesmo os objectivos da leitura obrigatória;
  • Como eu também já disse na minha crónica Ler menos também era capaz de ser boa ideia, há dois tipos de pessoas – as que lêem e as que não lêem: no fundo, estes dois tipos correspondem aos indivíduos que apreciam a leitura e aqueles que preferem outras actividades. Forçar os segundos a ler é inútil, atendendo ao ponto anterior, e pode levar a que a pessoa não queira, mais tarde, começar a ler, com base na sua experiência (Isto é apenas uma conjectura, e conheço casos de pessoas que, tendo lido um livro na escola, só gostaram dele mais tarde). Impor leituras a quem já lê só é prejudicial, sendo eu mesmo a prova viva desse facto. Tenho lido pouquíssimo ultimamente à custa daquele calhamaço de setecentas páginas e da vontade infinitesimal (e que continua a diminuir) que eu tenho de o ler. Ou seja, eu, na verdade, estou a ler menos do que leria se não tivesse este empecilho no caminho – e a ficar infeliz por isso. Quando ter um livro para ler faz com que nos sintamos mal, é sinal de que algo se passa de muito errado.

Mais triste ainda é saber que estes problemas poderiam até ser minorados grandemente com uma simples medida: limitar o tamanho das leituras obrigatórias a, digamos, umas 200 páginas. Pela minha experiência, mesmo na ausência de uma motivação, é possível ler um livro desses em poucos dias. Assim, pegava no livro, lia, fechava, e mesmo com glossário e biografia, rapidamente poderia partir para outro livro.

Dadas as nefastas consequências, torna-se cada vez mais difícil compreender por que diabo existe este tipo de leituras, e, especialmente, por que é que as pessoas continuam a insistir nelas mesmo quando chamadas à razão. Lamento estar a dizer isto de algumas dessas pessoas, mas, para ver a realidade fundamentada como eu a fundamentei e continuar a não a aceitar, é mesmo preciso ter uma grande falta de bom senso.

Bem, eu agora penso publicar tudo isto no blog, e aproveito para fazer um pequeno comentário. Esta situação já grassa há bastante tempo, e, desde a última vez que escrevi acerca do assunto, não foi resolvida. Normalmente, seria ligeiramente tolo estar a falar duas vezes do mesmo assunto – mas a gravidade da situação assim o exige, pelo que há que sacar da liberdade de expressão (que, felizmente, ainda temos) outra vez.

Assim sendo, nada mais me resta acrescentar do que a consequência última e mais recente de todo este descalabro. Tal é a indisposição que me provoca saber que poderia ter tido muito mais prazer a ler se tivesse lido os livros que escolhi, que já estou a ficar com bastante vontade de pôr o calhamaço na prateleira de vez e passar às leituras que, de facto, me enriquecem e me dão vontade de ler mais.

Ler mais. Engraçado... onde terei eu lido essa frase?

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